Pode-se dizer que dona Derly Moreira Chaloub foi
pioneira, sem saber, do que hoje alguns hospitais praticam: o
atendimento médico humanizado. Muitas décadas antes, generosa e
solidária por natureza, dona Derly sempre fez questão de visitar os
doentes, levando carinho e uma palavra de conforto a cada um. Assim foi
enquanto pôde. A matriarca do Hospital São Lucas, como era
carinhosamente chamada, faleceu ontem, aos 95 anos, depois de uma vida
inteira dedicada aos doentes do hospital fundado pelo pai, o doutor
Dermeval Barbosa Moreira, há 50 anos. Muito antes disso, dona Derly o
ajudava no consultório onde o médico atendia os pacientes mais pobres.
“Derly Chaloub não tinha boas recordações da política. Seu irmão
Vanor foi deposto no regime militar acusado de ser comunista. Recorda-se
de uma noite em que a diretora da telefônica, que gostava muito do
doutor Dermeval, foi a sua residência e relatou que ouvira uma ligação
de uma pessoa importante do gabinete do Dr. Vanor ligar para a Marinha,
no Rio de Janeiro, acusando o seu irmão de comunista. Foi ela quem
recebeu a denúncia. Era tarde da noite, e não quis incomodar seu pai,
mas no dia seguinte, narrou-lhe o fato. Dr. Dermeval foi juntamente com o
seu filho, o então prefeito Vanor, ao Sanatório Naval para esclarecerem
os fatos e aquela denúncia. Mas as denúncias continuaram e seu irmão
perdeu o mandato de prefeito manu militaris.
Quando perguntada sobre a vida social no passado, Derly respondeu
que a população de Friburgo era fria como o clima, e que antigamente
não acontecia quase nada. Mas quando nos fala de seus anos dourados,
percebemos que não era bem assim. Além dos bailes que frequentava amiúde
no Hotel Cassino (já esse hotel era localizado onde é hoje o Edifício
União) e do Xadrezinho, Derly participava de uma orquestra de acordeão
da cidade. As sessões de cinema e os passeios na praça eram
inesquecíveis. Havia um trem que vinha de Porto Novo e passava às nove
horas da noite pela praça. Era chamado de “vassourinha”, isso porque
quando ele passava, todas as moças “decentes” tinham que ir para casa.
Derly ri quando se recorda dos tipos de rua engraçados da cidade: o
“Olímpio Errado”, que colocava a frente da calça para trás e o povo
gritava: “Olímpio Errado”; ou ainda do “Chandoca” que tocava banjo,
muitas vezes, à noite, debaixo de sua janela.
No cinema Leal, antigo Teatro D. Eugênia, com a chegada do verão e
das férias escolares, Derly e as Zamith, Braunes, Dutra, Carneiro e
Carrapatoso promoviam apresentações teatrais. Ensaiavam umas quatro
peças por temporada sob a direção Moacir Peixoto, que era de Friburgo.
Os turistas gostavam muito dessas apresentações, “era muito caprichado”,
recorda-se. Peixoto trazia do Rio de Janeiro o cenário e o figurino. O
grupo participava do concurso de teatro amador no Ginástico Português,
no Rio de Janeiro e se apresentava ainda no Teatro Municipal de Niterói.
É interessante como desde o final do século XIX, a elite carioca e
friburguense tinham no teatro amador, uma de suas formas de
sociabilidade. Não se denominavam atrizes, mas “amadoras”. Havia ainda
uma orquestra na cidade, orientada por Sérvio Lago, de uma família de
músicos, e Derly também tocava na orquestra como pianista. Os músicos
também participavam das apresentações teatrais. Em suas memórias, Derly
Moreira Chaloub relembra a dor pela perda de muitos familiares queridos.
Mas em contrapartida, o sorriso e a alegria no semblante quando se
recordou da sua juventude e dos tipos mais ordinários e divertidos do
cotidiano da cidade: o Olímpio Errado e o Chandoca."*
Para a família enlutada, direção e equipe de A VOZ DA SERRA enviam o mais profundo pesar.
* Fonte: Histórias e Memórias de Nova Friburgo, blog da historiadora Janaína Botelho (Texto baseado nas memórias de Derly Moreira Chaloub, entrevistada em 2010)
Texto extraído da página: http://avozdaserra.com.br/noticias/obituario-dona-derly-moreira-chaloub-matriarca
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